1 - INTRODUÇÃO
Os sedimentos de corrente têm sido usados na exploração
mineral por milênios, como um dos métodos mais antigos de mineração e
prospecção, avançando da extração de ouro ou diamante para abordagens
geoquímicas modernas. São o meio de amostra mais comumente usados para
exploração de reconhecimento em casos para os quais a mineralização e/ou
alteração alvo são expostas ao intemperismo e arrastamento em sedimentos de
drenagem e/ou materiais orgânicos (ROSE et al, 1979).
Eles evoluíram
da extração de ouro e diamantes para métodos geoquímicos modernos e são uma
opção econômica para cobrir grandes áreas em pesquisas geoquímicas,
direcionando para investigações mais detalhadas. Recentes avanços em técnicas
analíticas e instrumentais, além de novas pesquisas em química mineral,
aumentaram a importância dos sedimentos de corrente na compreensão da geologia
regional e na descoberta de novos depósitos minerais (Doherty et alii, 2023).
O princípio por trás desse método
é que os sedimentos representam material erodido do solo mais alto e, portanto,
a partir disso, a geologia da área de captação pode ser inferida. Ao planejar
uma pesquisa através de sedimentos de corrente e interpretar os dados obtidos,
é essencial considerar a geoquímica dos processos superficiais, a formação de
depósitos minerais e o zoneamento geoquímico em torno desses depósitos para se
obter a melhor eficácia desse método geoquímico.
Os sedimentos de córregos são o produto de material intemperizado e erodido acumulado dentro de uma bacia de drenagem. Os processos de intemperismo variam globalmente e o material aluvial pode resultar da ação do vento, água e/ou gelo, e movido por processos fluviais. O sedimento pode ser derivado de rocha, solo, materiais eólicos e/ou till glacial.
O sedimento ativo de drenagem, mais comumente chamado sedimento de corrente, é aquele material não consolidado, que está sendo continuamente transportado na corrente da drenagem por saltação, tração ou suspensão, misturado na zona de maior fluxo da corrente (stream sediment). Esse material é representativo de toda a bacia a montante e inclui contribuição clástica e hidromórfica de águas, material clástico de margens de córregos, material orgânico e material precipitado da água de córregos. O Sedimento inativo de drenagem é o material transportado por tração, saltação e suspensão pela torrente das cheias e que se deposita marginalmente à corrente; o material desmoronado das margens e acumulado próximo da fonte sem transporte significativo e o material de densidade elevada, que se deposita seletivamente nos locais onde ocorrem obstáculos no leito ou onde a corrente muda de direção (LICHT, 1998).
3 - PESQUISA DE SEDIMENTO DE CORRENTE
A pesquisa
de sedimentos de corrente baseia-se no conceito de que os processos químicos e
fluviais transportam metais e minerais de uma bacia de drenagem (bacia
hidrográfica) para um local de acumulação mineral (uma anomalia), sendo essa
área bem definida pelos limites da bacia de drenagem.
Os
elementos são transportados por uma combinação de processos fluviais, físicos e
químicos. O processo dominante dependerá do clima e das características de
corrente da bacia de captação (i.e., do relevo topográfico).
O conteúdo
do metal (ou mineral) anômalo diminui drenagem abaixo, formando um trem (trend)
de dispersão. A curva de decaimento reflete a diluição de material não
mineralizado. A chave para a detecção de uma fonte mineral é acompanhar o trend
de dispersão e identificar corretamente o que é anormal.
4 - MÉTODOS DE AMOSTRAGEM
O programa de amostragem deve ser cuidadosamente planejado para que seja escolhida a granulometria correta do sedimento, dependendo de quais minerais o geólogo está procurando. Os locais para amostragem devem ser cuidadosamente selecionados para que não sejam afetados pela contaminação a partir de fontes industriais, agricultura, silvicultura, de estradas a montante e outras atividades humanas. Além disso, tributários de menor escala são escolhidos em vez do próprio rio principal, para que os resultados possam ser alocados com mais confiança a uma área específica que alimenta esse riacho (GSI, 2024).
4.1 Amostras de Sedimento de Corrente de Fração Fina
A
amostragem de sedimento de corrente de fração fina é muito utilizada para
levantamentos geoquímicos regionais multielementares. Sua densidade depende da
escala do mapeamento e do estágio do programa de exploração, bem como das
variações do terreno. De acordo com Doherty et alii (2023), a densidade de
amostragem pode variar de 1 amostra/10 km2 ou até 1 amostra/20 km2,
na fase de reconhecimento, ou 1 amostra/1–2 km2, em levantamentos de
acompanhamento. Se depósitos minerais conhecidos estiverem presentes na área, é
importante amostrar a jusante destes, bem como distalmente a eles para
representar o teor de fundo.
É fundamental que a amostragem seja
representativa de todos os sedimentos em uma bacia do riacho e, portanto, se
possível, com adição de subamostras de sedimentos dentro do riacho (canal
principal, barras, redemoinhos etc.) coletadas a uma distância de 5–100 m em
cada local. Recomenda-se que a amostragem seja realizada 2 a 3 meses após o
período chuvoso, quando os sedimentos estão enriquecidos em colóides
floculados.
De acordo com Doherty et alii
(2023), as orientações gerais para selecionar bons locais de amostragem em um
determinado riacho incluem o seguinte:
(1) coletar amostras bem abaixo
de uma junção de dois tributários de corrente, em vez de imediatamente abaixo,
para garantir que os sedimentos de ambas as fontes tenham sido misturados;
(2) coletar amostras a montante
de pontes, bueiros ou outras perturbações humanas para evitar possível
contaminação;
(3) evitar áreas com fontes
óbvias de contaminação, como barris de combustível antigos ou áreas de descarte
de resíduos;
(4) em situações em que pequenas
correntes entram em tributários principais maiores, coletar amostras a montante
o suficiente no tributário menor para evitar a planície de inundação do riacho
maior. Amostras de sedimentos de corrente devem ser coletadas através do canal
de drenagem ativo para serem o mais representativas possível;
É sempre recomendável coletar
amostras em duplicata, seja para checagem laboratorial, uso de diferentes
processos analíticos ou reanálises.
O tamanho
da amostra necessário variará dependendo do material disponível, se a
peneiração de campo foi concluída ou não para remover material grosso e da
quantidade de material necessária para análises.
Doherty et
alii (2023) recomenda uma peneira de campo de <2 mm para amostra de 0,5 kg,
exceto para programas projetados especificamente para exploração de ouro, que
exigem maiores volumes de material.
Uma peneira
de campo de aço inoxidável de 2 mm é útil para eliminar material de seixos
maiores e orgânicos, e essa peneira deve ser limpa no campo entre as amostras.
O material coletado no campo pode então ser peneirado em frações de tamanho
mais fino no laboratório.
Em geral,
frações finas ou ultrafinas (silte ou <69 μm; argila ou <2 μm,
respectivamente) são úteis porque tendem a produzir resultados mais
reprodutíveis e anomalias de maior contraste do que frações mais grossas e são
menos afetadas pelo efeito pepita de ouro.
Se os riachos tiverem água, a
peneiração de malha mais fina pode ser feita efetivamente no campo, pois
elimina a necessidade de transportar grandes amostras e posterior peneiramento
em laboratório; porém, se os riachos estiverem secos ou úmidos, a peneiração
mais fina no campo pode resultar em contaminação de um local para o outro.
Caso específico do ouro
Segundo Doherty et alii (2023), a
prospecção de ouro exige metodologia específica, quando são usados sedimentos
de corrente, devido às características únicas desse metal: ocorre em menor
concentração três ordens de magnitude do que outros elementos alvo de
exploração comuns; comumente ocorre como pepitas quase puras e essas pepitas têm
densidade cerca de cinco vezes maior que as de outros minerais encontrados em
sedimentos de corrente. Essas características combinadas tornam a dispersão, o
arrastamento, a amostragem representativa e a análise diferentes de outros
alvos de sedimentos de corrente. Em consequência, os métodos padrão, que eram
adequados para exploração de sedimentos de corrente de metais básicos, são
inadequados para sedimentos de corrente na exploração de ouro.
A metodologia mais atualizada para
pesquisa de ouro através de sedimentos de corrente aplica os seguintes
procedimentos:
(1)
aumentar o teor de ouro, coletando amostras em armadilhas de minerais pesados
e outros ambientes deposicionais, (2) diminuir o tamanho do grão, focando em tamanhos de grãos cada vez
menores para a alíquota analítica, ou (3) aumentar o peso da amostra
analítica para atingir a precisão necessária para o uso eficaz de sedimentos de
corrente, utilizando técnicas laboratoriais de lixiviação de cianeto (CN).
Uma desvantagem das técnicas de lixiviação CN é que elas são ajustadas para determinação de ouro, mas não permitem a determinação de outros elementos traço. Por esse motivo, é aconselhável que os elementos traço sejam determinados em uma segunda amostra coletada no mesmo local (duplilcata), ou em uma segunda alíquota da amostra original (Doherty et alii, 2023).
4.2 - BLEG
O método BLEG (bulk leach
extractive gold) foi desenvolvido na década de 1980 para reduzir o efeito
do ouro em pepitas. Hoje, ele pode ser usado em exploração para determinações
de ouro traço, fornecendo resultados robustos e consistentes. O grande tamanho
de amostra utilizado pode ajudar a diminuir a influência do ouro grosso,
tornando os resultados mais reproduzíveis. Amostras de áreas com ouro grosso
podem usar BLEG pareado com análises AAS ou ICP-MS para relatar resultados
reproduzíveis de baixo nível.
Embora o termo BLEG seja de uso geral, a técnica evoluiu com várias
versões, incluindo diferentes métodos de amostragem, tamanho de frações, bem
como tratamentos pré e pós-lixiviação e métodos de determinação analítica. Como
resultado, não há dois métodos 'BLEG' iguais. A maioria dos laboratórios
comerciais oferece uma opção de 'BLEG', mas os procedimentos não são bem
padronizados.
É necessário coletar material de
tamanho fino – silte a argila – onde os flocos finos de ouro estariam
depositados. Dada a sua forma, esses flocos finos de ouro não agem
hidrodinamicamente como minerais pesados e não se depositam nos mesmos locais
em um leito de riacho. Sempre que possível, devem ser feitas tentativas de
amostrar locais de inundações repentinas (onde o material mais fino se
concentra) – depósitos de margens.
O BLEG requer a coleta de
amostras grandes, geralmente maiores que 2 kg. De acordo com Doherty et alii
(2023), o procedimento atual para as
pesquisas BLEG personalizadas consiste na coleta de uma amostra de fração mais
fina de 1–10 kg no campo, processamento em um laboratório interno focado na
atualização da fração de amostra de argila e silte fino, seguido por análise de
lixiviação de CN para determinação de Au–Ag/ICP-MS e análise de múltiplos
elementos com ataque de água régia/ICP-MS.
4.3 - Concentrados de minerais pesados - CMP
Os minerais detríticos pesados
são aqueles com densidade maior que o quartzo e o feldspato (2,65 e 2,76,
respectivamente). A prospecção por CMP utiliza
as propriedades gravimétricas dos minerais resistentes ao intemperismo, visando
separar frações que contenham assembleias mineralógicas características de
determinados ambientes metalogenéticos. O uso de CMP é um método rápido, barato
e eficaz de dar início a um programa de exploração mineral em uma área com
cobertura suficiente de riachos, permitindo o foco na presença e química de
minerais indicadores.
No passado, utilizavam-se minerais que podem ser facilmente
identificados visualmente, como ouro, pedras preciosas e minerais de estanho e
tungstênio. A partir do início da década de 1970, minerais indicadores de
kimberlito têm sido usados para exploração de diamantes. Nos anos mais
recentes, têm sido realilzados estudos focados em frações de minerais pesados
de till ou sedimento para determinar minerais indicadores específicos e os
resultados mostram que há minerais diagnósticos indicativos de depósitos de
cobre porfírico, depósitos magmáticos de níquel-cobre, depósitos metamórficos de
sulfeto maciço, depósitos do tipo Broken Hill e uma variedade de outros tipos
de depósitos (McClenaghan et al. 2020). Técnicas automatizadas de
microscópio eletrônico de varredura (Scanning Electron Microscope - SEM)
substituíram a identificação visual de minerais, e agora há opções para
analisar a amostra de CMP total ou utilizar técnicas microanalíticas, como microssonda
eletrônica (EMP) e ablação a laser ICP-MS (LA-ICP-MS). A química e a zonação de
minerais específicos em uma amostra de CMP podem adicionar resultados
significativos às ferramentas de exploração.
A amostra
de CMP deve ser coletada especificamente em locais de corrente que são mais
propensos a conter minerais com densidades maiores do que as de quartzo e
feldspato, os ambientes deposicionais onde a velocidade da água diminui: barras
de pontal, barras de cascalho, atrás e sob grandes pedras ou entre e sob pedras
do leito. Em corrente sem pedras de leito ou cascalho grosso, o material pode
ser coletado de barras ou de raízes de plantas que crescem ao longo da
drenagem. Qualquer área com estrias minerais pesadas de areia preta (magnetita)
ou granada provavelmente contém outros minerais pesados.
As melhores práticas recomendam
peneirar o sedimento no local da amostragem para fração de tamanho <2 mm
(malha −10). A amostra total de CMP pode então ser enviada para processamento
laboratorial detalhado ou pode ser refinada ainda mais pelo bateiamento no
campo. No entanto, a preparação dos concentrados pode ser feita no campo com a
utilização de uma bateia, a partir de uma amostra de cerca de 10 a 20 litros.
O bateiamento vai um passo além
da coleta e peneiramento do sedimento de corrente, pois a camada final de
sedimento na bateia é parcialmente submersa na água e sacudida em um ângulo
baixo para separar o material mais leve, que flutua, do material mais denso,
que permanece. Devido à alta densidade dos minerais pesados, essa técnica
simples tem sido utilizada globalmente por milênios e é a principal ferramenta
de expansão da atividade garimpeira no Brasil. No campo, o bateiamento pode
remover até dois terços do material e pode ser repetido até que os primeiros
sinais de minerais pesados, como areia preta ou granadas, sejam visíveis na
bateia.
Pesquisas que buscam apenas
alguns grãos minerais de diagnóstico, como pesquisas de kimberlito, não são
processadas no campo e a amostra total de 10–20 kg é enviada para um
laboratório especializado em preparação de CMP..
4.4 - Química Mineral Indicadora de Grãos de Sedimentos de Corrente
A aplicação
dos concentrados de minerais pesados depende do objetivo da pesquisa. Se a meta
for identificar minerais valiosos como ouro, diamante, platina ou cassiterita,
o estudo pode se limitar à observação dos minerais presentes, suas proporções e
a análise da forma dos grãos. Porém, para investigar a composição química dos
halos de dispersão clástica, é essencial realizar uma análise química
multielementar dos concentrados, juntamente com uma descrição mineralógica.
Isso permitirá estabelecer uma conexão entre a composição química e a
mineralogia presente. (LICHT, 1998).
No passado, a identificação
mineral em amostras de CMP era realizada opticamente com uma lupa de mão ou
microscópio binocular, mas nas últimas décadas essa identificação passou a ser
feita em laboratório com o uso de um microscópio eletrônico de varredura (Scanning
Electron Microscope - SEM). Mais recentemente, programas de softwares
comerciais foram desenvolvidos para fornecer identificação automatizada de
dezenas de milhares de grãos.
A mineralogia automatizada
oferece uma grande vantagem em termos de qualidade e quantidade de dados
obtidos em comparação com a determinação visual, pois minerais indicadores
raros e de baixa abundância podem ser perdidos na observação visual tradicional
ou podem aparecer como inclusões em outros minerais resistentes. Atualmente, a
pesquisa em química mineral indicadora é um dos principais tópicos de estudo na
comunidade de geologia econômica. Os minerais mais comumente utilizados nesses
estudos, além daqueles de interesse econômico, são o zircão, a granada, a apatita
e o espinélio.
REFERÊNCIAS
Rose, A.W., Hawkes, H.E. and
Webb, J.S. 1979. Geochemistry in Mineral Exploration. 2nd ed. Academic
Press.
DOHERTY, Mary E.;
ARNDT, Kiel; CHANG,
Zhaoshan; KELLEY, Karen e LAVIN, Owen.
Stream sediment geochemistry in mineral exploration: a review of fine-fraction,
clay-fraction, bulk leach gold, heavy mineral concentrate and indicator mineral
chemistry. Geochemistry: Exploration, Environment, Analysis, 24 Nov
2023, https://doi.org/10.1144/geochem2022-039.
GSI - Geological Survey Ireland.
Stream Sediments. Disponível em: https://www.gsi.ie/en-ie/programmes-and-projects/minerals/activities/mineral-exploration/Pages/Stream-Sediments.aspx.
Acessado em: 24/8/2024.
LICHT, Ottavio Augusto Boni. Prospecção
geoquímica: princípios, técnicas e métodos. CPRM, Rio de Janeiro, 1998.
McClenaghan, M.B., Beckett-Brown,
C.E., McCurdy, M.W. and Casselman, S.G. 2022. Stream sediment indicator mineral
signatures of the Casino porphyry Cu-Au-Mo deposit, Yukon, Canada. Economic
Geology, 118, 411–431, https://doi.org/10.5382/econgeo.4970.
AUTORIA
Márcio José dos Santos. Geólogo, Mestre em Planejamento e Gestão Ambiental (PUC-Brasília), Mestre em Administração (Fac. Pedro Leopoldo), professor. Blogs dedicados à estudantes de Geologia:
https://geomartelo.blogspot.com/ (Geologia de Campo).
https://professormarciosantosgeo.blogspot.com/ (Geoquímica);
https://professormarciosantos3.blogspot.com/ (Climatologia);
https://professormarciosantos4.blogspot.com/ (Geologia Estrutural);
https://professormarciosantos5.blogspot.com/ (Sedimentologia).
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